O Bem-Amado é uma das mais famosas farsas sociopolítico-patológicas. O autor, responsável por retumbantes êxitos teatrais e cuja obra tem por denominador comum a contestação política e social, fornece ao leitor um irresistível retrato dos costumes da vida de um lugarejo do interior baiano, ordeiro e pacífico, para inauguração de um cemitério – plataforma política de seu ambicioso prefeito, Odorico Paraguaçu. O problema: ele precisava providenciar um morto. Odorico, o Bem-Amado, é a encarnação, em escala provinciana, de personagens bem mais sinistros da vida política latino-americana, ditadores, caudilhos, demagogos de todos os tipos, e cujo perfil ora cômico, ora patético, a rica imaginação do autor delineia de forma precisa e contundente. Naturalmente, o protagonista é também um ser humano em crise. O vácuo entre suas pretensões de grandeza, que comicamente se revelam na empolada linguagem, e a triste realidade de uma região, para ele frustrantemente subdesenvolvida, acentuam as contradições de sua existência e da própria política que ele representa e personifica. Odorico, o político, o doutor, o tribuno, Odorico, o Grande, o Pacificador, é a engraçada e irônica versão da realidade política brasileira e latino-americana como os Somozas, os Pinochets, os Batistas, os Videlas e outros mais bem-conhecidos do público brasileiro, uns mais, outros menos “simpáticos”, mas todos com o mesmo objetivo: inflar o próprio ego à custa do povo. O Bem-Amado, sátira cristalina e contundente, é outra manifestação do criativo talento do mestre do teatro de contestação política e social que é Dias Gomes, de quem já tivemos peças igualmente aclamadas, como O Rei de Ramos, O Santo Inquérito e O Pagador de Promessas.
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